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Neste sábado, consegui um frila de revisão de texto em agência publicitária. Era material dos fortes: uns PPTs para uma concorrência de empresa pública, daqueles para entregar para ontem, o que inclusive explica ter sido em um sábado.

Pois bem, lá fiz as tais revisões. De fato, o ambiente estava pesadamente influenciado pelo prazo curto e, fora eu, todos os outros lá estavam inconformados de trabalhar em um sábado. Fora haver horas em que estavam ironizando bastante certos aspectos do tal trabalho.

Porém, houve algo que me fez até passar batidas as 12 horas que lá fiquei: o ambiente. Não sei quantos jornalistas que lêem estas postagem já puderam ter a oportunidade de ver uma agência publicitária fazendo fechamento, mas digo que é algo muito mais civilizado que os fechamentos jornalísticos. Não vi nenhuma reação animalesca quando abordava alguém que estava absorto em seu computador.

Além disso, o ambiente em si era muito mais leve. Piadas surgiam a toda hora e não ouvi um grito sequer. Se havia algo mais grave, era discutido com civilidade. Sei que publicitários também podem ler esta mensagem e discordar de mim, mas garanto ter sido uma boa experiência a revisão publicitária.

O pessoal lá também se surpreendeu com meu estilo de revisão, uma vez que até alertei para detalhes de informação e contraste fundo-letra que impedia o conforto de leitura. Imagino que tenham gostado do que viram e quem sabe possa pintar algo mais da agência em questão.

E fico aqui pensando sobre um dia utópico em que veremos redações tendo esse ambiente mais zen, em que não será rotina a soltura de cachorros. Vale lembrar que tanto jornalismo quanto publicidade costumam ter prazos exíguos e altos graus de espremeção cerebral para que algo saia do jeito certo, bem como jornadas amplas dependendo da ocasião. Porém, o que vi na agência em questão foi justamento o oposto do que veria em uma redação.

Eis que o pessoal do trabalho mais braçal pega um pincel atômico e faz um desenho bem obsceno na lousa da sala e a superior chega à tal sala e fica silenciosa. O que ela faz? Olha para o tal desenho, conversa um pouco com o pessoal e depois, solta uma risada daquelas com o besteirol todo. Fico pensando o que aconteceria se algo assim estivesse em uma redação e fosse uma editora-chefe que visse alguém fazendo uma coisa dessas. Talvez pudesse significar até mesmo a demissão de quem fez tal coisa. Já outro imediatamente fazia uma videomontagem com um áudio do comercial, o que em tese daria toda justificativa para que alguém chegasse e dissesse que ele está desperdiçando tempo e atrapalhando um processo inclusive industrial. Mas não: olharam para o outro besteirol e mais risadas surgiram.

Depois de uma comparação dessas, fico pensando o quanto que o modo de ser carrancudo de nossos jornalistas está sendo transferido para o texto. Isso para não perguntarmos se também está na hora de mudar o conceito de redação como conhecemos para que haja mais conforto ao jornalista. E tudo isso de maneira alguma comprometeria o postulado da isenção e de ouvir os dois lados.

Alguns dirão que publicidade recebe mais grana que jornalismo e que a grana que o jornalismo recebe é a raspa de tacho da publicidade, mas lembremos que há veículos de comunicação jornalística que recebem rios de dinheiro e nem de longe têm o ambiente da agência de publicidade que conheci, que não é das grandalhonas do Brasil, ainda que tenha clientes muito bons. Assim sendo, creio que haja também uma questão de postura coletiva dos publicitários que difere daquela dos jornalistas.

Ontem, estava assistindo ao primeiro capítulo da nova minissérie da Globo e houve uma cena que, para mim, disse tudo: foi aquela hora em Tito, Ivan e Paulo estão juntos na redação.

Sendo a história ambientada em 1989, nada mais natural que a redação fosse tomada por máquinas de escrever, principalmente se pensarmos que o lugar em questão era o inferno na Terra. Porém, quem fosse jornalista via muitas coisas que não mudaram muito em quase 20 anos.

Tito é repórter e trabalha em uma revista masculina beeeeeem chinfrim. Além de repórter, acumula o cargo de produtor. Comunista roxo, odeia o trabalho de fazer triagem das mulheres que irão posar, algo previsível dentro do conjunto de crenças que o permeia. Nicola, o dono da revista diz que cem pessoas fariam o trabalho de selecionar as fotografadas de graça e pergunta se Tito é bicha. Ao que Tito responde ser comunista. Aqui, até como uma alegoria de impactos recentes do fim da ditadura, o tal dono da revista (chamada Sexus), que teoricamente estaria do lado da liberdade de imprensa e de expressão, tem uma foto do general Médici na sala. Assim como comunistas de raiz ficaram bem raros da queda do Muro para cá.

Chega o tal cara e conversa com Ivan, o editor, a respeito do especial de Natal da revista. Falam de fazer uma capa toda branca. Até aí, morreu Neves, mas o motivo é justamente lembrar da palavra do sobrenome que citei agora pouco, mas no singular. Ao que prontamente respondem que no Brasil não neva no Natal. Nicola diz que essa é uma imagem que os Estados Unidos popularizaram no imaginário do mundo. Ele logo é retrucado pelo fato de que Natal com neve é coisa normal no Hemisfério Norte, mas não no Sul. A resposta é bem típica: “e você acha que nosso leitor sabe onde ficam os Estados Unidos?”.

Tudo bem que revistas masculinas, ainda mais de cunho pornográfico como a tal publicação sugeriu ser, não são a fonte de consulta que uma pessoa usaria para ter informações. Em 1989, as mais prováveis seriam revistas informativas, jornal, atlas ou enciclopédia. E não é no Brasil onde as pessoas apontam para a Austrália quando lhes perguntam onde fica o Irã.

Provavelmente, quem viu Nicola falar sobre o leitor deve ter dado um riso, pois a cena de fato tem seu humor. Para quem for jornalista, é o famoso “seria cômico se não fosse trágico”, pois continuamos a ouvir exatamente isso, quase duas décadas depois, e em uma sociedade com internet, GPS, Google Earth e mais um monte de coisas. Também continuamos a ver um bocado de Nicolas dando as cartas. E também vários (e bota vários nisso) Ivans, Titos e Paulos.

Não precisa ser uma revistazinha chinfrim com cunho pornográfico, mas muitos daqueles tidos como “o leitor” são atraídos pelo apelo aos baixos instintos e vão ficando nas publicações que querem mais que ele se dane não sem antes dar seu dinheiro ou audiência. Muitas são as Sexus em que os colegas trabalham.

O mundo mudou muito de 1989 para cá. E o jornalismo, mais sua relação com o leitor? OK, tivemos uma porrada de danças de cadeiras, mas falo dos ambientes de trabalho. E também da postura dos colegas frente certas coisas. Quem é o jornalista hoje?

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